terça-feira, 21 de abril de 2009

ESPECTROFOTOMETRIA

Espectrofotometria: chacoalhar moléculas

[Veja também a versão acrescentada de 2004 deste texto.]

Medir é basicamente chacoalhar o objeto sob estudo, e ver o que acontece. Uma maneira boa de cutucar moléculas, é com radiação eletromagnética (luz). O princípio de espectrofotometria é deixar incidir luz em uma molécula, e detetar como a molécula afeta a luz. Um espectrofotometro é um aparelho que deixe você controlar o comprimento de onda da luz incidente na sua amostra, e que indique a razão T entre a intensidade da luz que incidiu e a luz que conseguiu atravessar a amostra: T = I/I0. O espectro de uma determinada substância, T em função do comprimento de onda, é característico para cada substância. Mas existem duas possíveis razões porque a luz não chega no detetor. A luz incidente pode ter sido absorvido, ou pode ter sido espalhada. Os mecanismos são um pouco diferente, e dependem de caraterísticas diferentes das moléculas em estudo.

Para entender isto melhor, é necessário pensar sobre a interação entre luz e moléculas. Mas não podemos nem começar pensar sobre a interação entre duas coisas se não conhecermos, pelo menos qualitativamente, a estrutura das duas coisas.

O que é uma molécula? É uma partícula com eventualmente uma estrutura interna. Uma partícula pode ser caracterizada por uma energia e uma velocidade (melhor: momento). E a estrutura interna? Neste contexto, a imagem quem tenho na minha cabeça é de uma nuvem de elétrons em volta de núcleos. Assim, se eu cutuco a molécula, a nuvem pode se deslocar um pouco, ou a molécula inteira pode vibrar ou rodar.

O que é luz? Luz é uma onda eletromagnética. Uma onda é caracterizada pela velocidade com que se propaga, a intensidade, e o comprimento de onda (ou a frequência). Em um determinado ponto no espaço, o que varia rapidamente (umas 1014 vezes por segundo) são campos elétricos e magnéticos.
ondas eletromagnéticas

Como os dois interagem? Uma molécula é feito de cargas (elétrons e núcleos) e um campo elétrico faz uma força sobre as cargas. Se a luz chacoalhe a molécula 1014 vezes por segundo, a molécula por sua vez vai emitir ondas electromagnéticas: luz. Isto é o espalhamento de luz por uma partícula pequena: se a partícula é muito menor do que um comprimento de onda (meio micron para luz visível), vai emitir ondas esféricas (em todos os direções). É a razão que o céu não é escuro durante o dia: além do que via o caminho direto, os raios de luz chegam aos nossos olhos via as moléculas do ar que espalham a luz em todos as direções. Na lua, o céu é escuro mesmo durante o dia lunar. Na terra, o céu é azul, porque moléculas espalham luz azul mais do que outras cores.

Uma molécula emite ondas esféricas com a mesma frequência e comprimento de onda da luz que incide, mas em um material denso (sólidos, líquidos) as moléculas ficam muito próximas uma da outra: a distância entre eles (tipicamente 0.001 micron) é menor do que um comprimento de onda. Neste caso as ondas esféricas de cada molécula interferem e se combinam para formar uma onda refratada que se propaga pelo material com uma velocidade menor e podemos introduzir os conceitos de índice de refração, lei de Snell, etc.

Voltando a uma única molécula: a imagem que tínhamos era de uma nuvem de elétrons ligados com os núcleos. Mas isto é um sistema parecido com um sistema mola-massa. Se chacoalhamos a molécula com a frequência certa, deve entrar em ressonância: uma força pequena (o campo elétrico da luz que incide) resulta em grandes deslocamentos dos elétrons. Em materiais densos, as vibrações dos elétrons são atrapalhadas pelos vizinhos, a molécula inteira vai vibrar, rodar; em suma, parte de energia da luz incidente é convertido em modos de vibração com frequências diferente: a luz incidente é absorvida e a sua energia é convertida em calor. Este efeito acontece nas frequências de ressonância das moléculas, que são diferentes para cada molécula porque depende da estrutura interna detalhada. Para vidro por exemplo, as frequências de ressonância ocorrem na ultra-violeta (comprimentos de onda menor do que 0,4 micron). Para luz visível, com comprimento de onda maior (0,7 — 0,4 micron) vidro é transparente. Moléculas de pigmento tem ressonâncias em frequências menores, absorvendo por exemplo luz azul, resultando em um materiais com cor vermelho.

Geralmente a palavra espalhamento de luz é usada para interações entre luz e partículas que não mudam a frequência da luz espalhada. No caso contrário, fala-se de absorção. Em um espectrofotômetro tem então pelo menos duas razões porque a luz não chega no detetor. A luz pode ser espalhado ou absorvido e é difícil distinguir entre os dois mecanismos se medirmos somente a fração de luz que consegue atravessar a amostra. Se você colocar o detetor de luz em ângulos diferente de 180 graus, vai conseguir mais informações, inclusive sobre o tamanho das partículas que espalham a luz.

Para concluir, um outro visão do processo de absorção. Vamos começar de novo com a imagem que temos dos atores: luz e moléculas. A vida não seria mais fácil usando partículas para cutucar as moléculas? Aí, poderíamos imaginar a interação como uma colisão de bolas de sinuca.

Mas segundo a mecânica quântica, é justamente isto: podemos descrever um raio de luz também como uma coleção de partículas (fotons) com energia hf e momento h/lamda. A intensidade do raio é proporcional ao número de fotons. Luz é uma coleção de partículas um tanto estranho, porque os fótons não são localizados, e um fóton só mostra os efeitos de interferência quando passa por uma fenda dupla. Segundo a mecânica quântica, luz é tanto uma onda quanto uma partícula, então podemos ter a imagem mais conveniente (para um determinado problema) nas nossas cabebeças.

Os elétrons de uma molécula não podem vibrar com qualquer frequência. Segundo a mecânica quântica, os elétrons somente podem estar em estados com determinadas energias. Um fóton só pode ser absorvido pela molécula (e assim excitar a molécula), se a diferença entre as energias é exatamente hf. A molécula pode decair do estado excitado para o estado original, emitindo outro fóton com a mesma frequência em uma direção qualquer: a luz é espalhada em todas as direções. Em materiais densos (sólidos, líquidos) no entanto, existem um monte de estados excitados, com energias distribuídas em uma banda. A de-excitação de uma molécula excitada pode então ocorrer via estados intermediários. Neste processo, a molécula emite fótons de frequência menores e isto corresponde a um processo de conversão da energia em calor.

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